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Esse não será um desses textos meio mórbidos e estranhos que lê pela internet, meio tentando ser autoajuda ou desenvolvimento pessoal, enquanto tentam ser aqueles textos que vão dar um tapa na nossa cara e fazer a gente levantar do sofá e correr para uma academia. Ou sei lá, pedir demissão, mandar o chefe ir para algum lugar escuro e, com sorte, apertado.
Não, acho que não. Talvez sim.
De certa forma, me deparei com essa novidade na qual você também já deve ter pensado. Nunca sofri um grande acidente. Nem tive o lance de quase morte. O lance que faz as pessoas ficarem pensando na vida depois e voltam dizendo que viram Deus ou que agora as coisas serão diferentes. Tudo mudará. Essa é a promessa que dura alguns dias e depois esfria. Quando percebem, já voltaram na mesma rotina. Que loucura, não pedi demissão.
Penso sobre isso num dia de chuva. Um calor invade minha sala de estar que só tem um sofá e uma mesa de centro baixinha que usamos para almoçar, pois vimos um vídeo de uma japonesa fazendo isso. Vivemos cópias do que achamos aos montes pela internet. Nos esforçamos para ser o copiar e colar do Pinterest.
Penso na morte enquanto as gotas de chuva batem contra o toldo que protege o quintal onde está a casinha do cachorro. Penso sobre isso após ler alguma coisa em um livro e lembrar de um texto do
.Penso na morte como o fim que está chegando. Se eu tiver sorte, não será amanhã, nem daqui a uns minutos. Alguns podem dizer que o meu tempo está nas mãos de Deus, só vou quando ele desejar. Se eu tiver sorte e se Deus tiver algum plano mais longo pra mim, estarei bem até daqui a uns 80 anos, quem sabe.
Atualmente não faço exercícios. Trabalho talvez mais de quinze horas por dia. Me alongo umas duas vezes. Não como fast food, nem bebo álcool ou refrigerante. Não consigo manter minhas pernas esticadas por muito tempo, pois devo ter algum problema nas circulações. Não aguento correr por um quilômetro sem meus pulmões queimarem. Não consigo fazer mais de dez barras. Mas consigo fazer mais de trinta flexões.
Tem esse zumbido no meu ouvido e as enxaquecas quase diárias. Não sei o que você pensa sobre isso, mas não tenho certeza se chegarei tão bem aos 80 anos se continuar assim. Nem mesmo se estiver nos planos de Deus. Talvez eu chegue nos 80, mas estarei parecendo um maracujá muito, muito maduro. Darei um bom suco e só.
Por isso, pensei na morte. Se não estiver nos planos de Deus uns 80 anos, sinto que estou deixando algo passar. Sabe?
Essa ideia de morrer nunca passou na minha cabeça. Nunca pensei nisso, nem mesmo depois da crise de pedras no rim. Tem isso também, posso morrer de problemas renais — Posso? Terei que pesquisar melhor.
Mesmo depois que minha cachorrinha morreu. Mesmo depois que meu tio morreu. Mesmo depois que o vô da minha esposa morreu. Não pensei na morte como penso agora ouvindo as gotas de chuva e enquanto meu cachorro boceja e percebo que precisamos escovar seus dentes.
Penso que a morte, esse negócio definitivo, a caveira usando preto e segurando uma foice. Esse símbolo gótico estiloso, vem em algum momento, e penso nas coisas que ainda não fiz por falta de tempo e essas coisas.
Calma, tá quase virando algo motivacional, fique aqui comigo.
Penso nisso. Penso nos livros que ainda não escrevi. Nos projetos que não postei, pois acreditava que alguém iria achar ruim. No canal do YouTube que não fiz. Na viagem para a Irlanda que não fiz por falta de dinheiro. E após uma pesquisa rápida percebi que se eu não tivesse trocado de PC, teclado, mouse e nem comprado um suporte para minha mesa, já poderia ter ido à Irlanda e vivido como um mendigo — tudo bem se for na Irlanda.
Agora você pensa, que entrei num papo sobre escolhas e prioridades. Um papo super mega batido que tá em alta no ramo da produtividade. Mas não tô falando para você escolher qual projeto fazer primeiro. Ou decidir qual coisa irá comprar primeiro.
Estou dizendo que eu morrerei. Você também vai. E isso nem é um spoiler. Vai todo mundo para o mesmo lugar. Não o mesmo, pois não ia caber tanta gente no mesmo caixão. E eu nem tenho dinheiro para um caixão tão amplo. Na real, eu queria ser cremado. Mas pensando agora, não tenho dinheiro para isso também. Se eu morrer, além de não ter feito tudo que queria, deixarei essa missão para minha família e não deixarei um centavo para que meu pedido seja realizado.
Será que existe a possibilidade de jogarem minhas cinzas naqueles penhascos irlandeses que vemos nos filmes?
Penso na morte e fico com vontade de me esforçar mais. Fazer as coisas e decidir coisas que vão realmente me fazer feliz. No momento em que o último bip da máquina soar, quero pensar que consegui fazer tudo que queria.
Tanta gente que eu queria levar pra tomar um café. Tantas coisas que eu queria fazer e uma delas é parar com o café.
Todas essas coisas vão sendo guardadas num bolsinho bem pequeno no fundo da mente e sendo escondidas por desejos momentâneos e banais que não fazem sentido depois de alguns dias.
Vou morrer, e aí? O que será que mudei?
Não estou dizendo naquela visão mágica de ser uma mudança no mundo. Nem uma mudança na vida de alguém. Estou visando na parte egoísta e individual, essa visão que parece loucura, mas a gente acaba esquecendo. No fim, o que importa mesmo é você se sentir feliz minutos antes de morrer.
O morrer de velhice e não de tragédia, pois de tragédia a gente arruma arrependimentos que nem fazem sentido — me arrependo de ter cortado a pipa daquele menino em 2003 quando tinha oito anos, penso nele até hoje.
Não faz sentido nenhum isso.
Pense na velhice. Não pense na morte. Pense na lembrança. O que você quer lembrar quando estiver quase sem dentes tentando comer um pé de moleque?
Talvez aquele dia que pulou a higiene bucal baterá na sua mente. Ou talvez se tivesse ido mais ao dentista. Ou quem sabe, se tivesse maneirado nos doces para ter evitado a diabete tipo 2.
Não sou muito de pensar no fim e quando pensei, percebi que o fim nem deveria ser pensado. O problema mesmo é fazer umas coisas e descobrir que não era o fim. Encher a cara hoje, pode ser que não tenha um amanhã, é ruim quando você acaba em coma alcoílico e descobre que precisa de um transplante de fígado e ficará no final da fila do SUS. Você ficará lá esperando o fígado ou o fim?
Agora que penso nisso e escrevo para você pensar comigo, sinto alguma coisa em meu peito e torço para ser ansiedade e não um ataque cardíaco, mas, por outro lado, se for ansiedade, passarei a vida tomando ansiolítico, que danificará outras coisas. Eu poderia fazer exercícios, mas fiz outras escolhas ruins que impossibilitam minha disponibilidade de tempo.
No fim, que não é um fim, se for um ataque do coração, a única preocupação seria a falta de plano de saúde. Outra decisão péssima que tomei, já que preferi gastar com outras coisas que pensar na saúde para daqui a uns 80 anos.
Vou morrer, e aí? Melhor agilizar as coisas antes que eu morra mesmo.
Vou começar um novo projetinho, na real, vou dar uma atenção mais fiel pra ele, e aqui está a estreia do que quero dar foco no próximo ano: Tirinhas.
antes de acabar quero deixar algo útil
o dólar está: R$4.91.
REGRA OITO:
Não tente criar e analisar ao mesmo tempo. São processos diferentes.
Irmã Corita Kent
você não entende muita coisa, mas faz sentido. na sua caixa de e-mail às quintas, o famoso crepúsculo da semana. ideias aleatórias como um vampiro que brilha.
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Gênio
Senti uma pitadinha de Palahniuk nesse texto, hein? Bom demais voltar a te ler por aqui, mano. Sinal que os dias de 14 horas de trabalho deram uma trégua? :)